Desde dezembro, quando foi sancionada a Lei nº 14.790, de 2023, os apostadores e as empresas de bets estão na expectativa pelo início das atividades desse mercado. Especialistas destacam, entretanto, que isso ainda depende da edição de vários atos regulamentares pelo Governo Federal, como portarias ou instruções normativas, já que a lei estabeleceu as principais diretrizes e regras gerais, remetendo a disciplina específica de vários temas à regulamentação infralegal.
Entre outros temas que carecem de regras mais detalhadas estão as formas de comercialização das apostas – ou seja, os tipos de jogos que poderão ser ofertados –, a segurança cibernética das plataformas, os meios de pagamento e recebimento de apostas e prêmios, as políticas prevenção à lavagem de dinheiro e a publicidade das bets. No início deste mês, o Ministério da Fazenda declarou em nota oficial que “serão editadas portarias de regulamentação dos mais diversos temas, em especial aqueles que ficaram a resolver” e que “a equipe do MF e demais órgãos e setores do Governo entendem como prioridade medidas de cuidado e proteção às pessoas”.
A partir de informações colhidas com fontes do Governo Federal, o mercado tem trabalhado com a expectativa de edição de 10 a 12 portarias diferentes. Antes de dar esse passo, é fundamental que o Ministério da Fazenda elabore e divulgue uma agenda regulatória para o setor.
De acordo com Fabiano Jantalia, sócio-fundador do Jantalia Advogados e especialista em Direito de Jogos, a construção de marcos regulatórios em setores novos da economia precisa ser precedida da elaboração de um planejamento da ação estatal, sobretudo para evitar iniciativas improvisadas ou precipitadas.
“Qualquer ação pública, ainda mais aquelas que tenham repercussão sobre interesse geral dos agentes econômicos e consumidores, precisa ser precedida de planejamento. No caso específico do setor de apostas, isso é ainda mais importante, porque se trata de um mercado completamente novo, que ainda precisará ser devidamente organizado pelo Ministério da Fazenda”, avaliou o advogado.
Esse planejamento, conforme Jantalia, não é mera formalidade, mas uma importante medida que submete a ação regulatória ao debate público. “A experiência nacional e internacional nos mostra que não se deve iniciar a construção de marcos regulatórios pela edição direta de normas. Antes de produzi-las, o Estado precisa definir o que, como e quando regulará e submeter esse planejamento ao debate público. Justamente por isso, o art. 17 da Lei nº 13.848, de 2019, conhecida como ‘lei geral das agências reguladoras’ obriga esses entes a elaborar, para cada período quadrienal, plano estratégico com os objetivos, as metas e os resultados esperados e elege a agenda regulatória como instrumento básico de planejamento da ação normativa”, afirmou o especialista.
Agenda regulatória: mais transparência no mercado de BETs?
Até agora, não se sabe ao certo quais e quantos atos serão editados, qual será a abordagem normativa que se pretende adotar e quando esses atos serão publicados pelo Ministério da Fazenda, o que tem deixado muitos operadores e até apostadores apreensivos.
Jantalia destaca que essa agenda precisa ser publicada antes que se inicie o processo de normatização, não apenas por uma questão de transparência, mas também para que essa produção de regras do setor possa ter maior legitimidade. “Não se trata de um mercado qualquer, mas sim de um segmento de atividade mundialmente conhecido por sua complexidade técnica. Nesse contexto, a divulgação de uma agenda regulatória para o mercado de apostas deixaria mais claras não apenas as diretrizes que vêm orientando os estudos do Ministério da Fazenda, como também os espaços e meios de participação e controle social do processo de normatização. Isso permitiria ao mercado conhecer e avaliar melhor o que vem sendo pensado, e até mesmo contribuir para o aprimoramento das minutas de normas”, frisou o especialista.
Para a construção dessa agenda pelo Ministério da Fazenda, Jantalia sugere que sejam tomadas como referências tanto as iniciativas de órgãos mais longevos, como o Banco Central e a CVM, como as de outros mais recentes, como Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).