Banco Central afirma que segregação patrimonial pode ficar de fora das regras iniciais para o mercado cripto no Brasil devido ao rito para se tornar lei
O Banco Central do Brasil afirmou, em uma apresentação recente, que o maior desafio na regulamentação das criptomoedas no país é criar regras efetivas para os serviços de criptoativos oferecidos por bancos como Nubank e Mercado Pago (crypto-as-aservice) e também exchanges globais sem sede oficial no Brasil como a Binance.
Segundo o BC, provedores de cripto-as-a-service, como a Paxos (que oferece serviços de cripto para diversas empresas no Brasil), assim como as stablecoins, integram o que o regulador chama de “5 maiores desafios” da regulamentação. O BC argumenta que eles estão no limiar do que são provedores de serviços de ativos virtuais (VASPs).
“Estes serviços são apresentados como de caráter tecnológico. Mas, ao analisarmos o termo e a definição de Vasp, entram no limiar de quando é Vasp ou não. Mesmo que não se enquadrem como Vasp, como são contratadas para prestação de serviço dessa atividade que é regulada, teremos que dispor sobre como esse contrato será formatado para garantir a proteção do cliente”, destacou Antonio Guimarães, consultor do departamento de Regulação do Sistema Financeiro do BC.
Deste modo, segundo o BC, na primeira proposta de regulamentação, tanto estes provedores como os emissores de stablecoins vão ficar de fora.
A regulamentação abordará a definição dos tipos de provedores de serviços de ativos virtuais (VASPs), a delimitação dos operadores no segmento de ativos virtuais, regras de tratamento para cada tipo de VASP e função, integração das instituições sob competência do Banco Central, revisão das normas de prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo, e proteção ao consumidor local, especialmente contra riscos de ataques hackers.
O BC já afirmou que o texto final da regulamentação só será publicado em 2024, possivelmente no primeiro semestre. Após a publicação, haverá um tempo de adequação para as entidades que já participam do mercado, como corretoras internacionais e nacionais, além de bancos e provedores de pagamento que oferecem opções de investimento com criptoativos.
Binance e segregação patrimonial
Outra grande preocupação do Banco Central é com relação às exchanges ‘offshore’, ou seja, as corretoras de criptomoeda globais que não têm sede oficial no Brasil, como Binance, OKX, Coinbase, Gate.io, Huobi, entre outras.
O BC argumenta que é ilusão achar que os brasileiros não vão acessar corretoras globais que não têm sede no Brasil. Porém, segundo o BC, isso cria uma certa insegurança jurídica, pois a empresa não seguirá as leis do país.
“Não há como impedir que um residente tenha acesso, mas cria uma insegurança jurídica no alinhamento da empresa com as leis do Brasil”, disse.
Outro desafio do BC é a segregação patrimonial, que não pode ser editada por meio de uma instrução normativa, mas precisa ser implementada por meio de uma lei específica, o que indica que também ficará de fora da primeira versão da regulamentação do mercado, já que, para se tornar lei, precisa ser aprovada pela Câmara dos Deputados, Senado Federal e obter sanção presidencial.
“O Código Civil exige que uma proteção a um grupo de credores seja por lei. Portanto, não pode ser por um ato infralegal”, afirmou Guimarães.
Recentemente, o Departamento de Regulação do Sistema Financeiro do Banco Central (Denor) anunciou que a proposta do BC é editar 3 atos normativos, 2 resoluções e uma instituição normativa.
“A primeira resolução será para tratar sobre conceitos gerais das VASPs, definindo o âmbito de aplicação e o objeto das VASPs, definições de conceitos para fins da norma, por exemplo, quais são os critérios e as modalidades de VASPs, qual tipo de operação vai poder ser explorada ou não”, explicou Paulo Portuguez, sócio do Jantalia Advogados.
Além disso, dentro desse ato normativo, também serão tratadas questões de conduta, como, por exemplo, capital mínimo, regras de instituições e quais instituições poderão, ou não, operar nesse setor – uma vez que, atualmente, empresas de criptomoedas ainda não precisam de autorização ou qualquer outra licença para operar no Brasil.
“Nessa segunda resolução, espera-se definir como se dará o processo de autorização, algo naturalmente burocrático e que demanda, de fato, um detalhamento mais aprimorado” disse o advogado.
Fonte: Revista Exame